Por um mundo corporativo mais diverso e inclusivo
Nina Silva foi eleita uma das 20 mulheres mais poderosas e influentes do Brasil em 2019 pela revista Forbes. A indicação se torna ainda mais relevante por ser a única negra da lista. Única, aliás, é uma palavra recorrente na vida de Nina, que contrariou todos os prognósticos.
Nascida e criada no Jardim Catarina, em São Gonçalo, região metropolitana do Rio, na época a maior favela plana da América Latina, formou-se em Administração de Empresas pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e trabalhou na área de tecnologia em grandes multinacionais.
Hoje, é project manager lead (gerente de projetos) na consultoria global ThoughtWorks, além de ter fundado o Movimento Black Money, que oferece oportunidades para alavancar a população negra, em condições de equidade no mercado empreendedor e nas empresas.
Recentemente, Nina esteve na Visa para um bate-papo com nossos funcionários, no qual contou suas experiências e inspirou com seus aprendizados. Confira abaixo algumas das perguntas e respostas que rolaram nesse encontro:
Qual a importância da diversidade e da inclusão para as empresas?
Pessoas com perfis semelhantes vão atingir um grupo pequeno e homogêneo, não impactando a sociedade atual. Já diferentes perfis de funcionários, com vivências múltiplas e olhares distintos, trazem mais soluções inovadoras e podem alcançar um público maior, ampliando o market share e aumentando a lucratividade da empresa. Essa relação foi comprovada pelo estudo “Delivering through Diversity” da consultoria McKinsey & Company, que mostra que empresas com maior diversidade cultural e étnica têm 33% mais chances de apresentar resultados acima da média do mercado.
Como as empresas podem promover a diversidade e inclusão?
As empresas podem procurar grupos e consultorias de recrutamento com foco em diversidade como também faculdades que desenvolvem programas de inclusão para os alunos. Já o departamento de recursos humanos, juntamente com os líderes, pode estabelecer metas para avaliação de currículos e entrevistas de emprego. Outra ótima ferramenta é o contato com os profissionais pelo LinkedIn. Nesse caso, é preciso ter uma rede social abrangente com diferentes perfis. Muitos líderes me pedem para divulgar oportunidades de trabalho no meu perfil do LinkedIn, pois minha rede contém profissionais negros. Além disso, nosso portal faz a ponte entre profissionais e empresas que buscam mais diversidade ao seu quadro de funcionários.
Qual é o objetivo do Movimento Black Money?
Somos um hub de inovação, com vários braços, cuja proposta é oferecer ferramentas para a inclusão, instrumentalização e autonomia da população negra por meio da educação e empreendedorismo para que os negros ocupem os espaços e dialoguem de forma igualitária. Também promovemos a construção de redes para pulverizar o consumo dentro da própria comunidade negra, gerando riquezas e movimentando a pirâmide social brasileira. Toda sexta-feira, subimos a hashtag #BlackFriday e destacamos um afroempreendedor. Buscamos ressignificar a palavra black money, que designa dinheiro sujo, e mostrar a imensa força desse mercado consumidor.
Qual o tamanho desse mercado consumidor?
O Brasil apresenta a segunda maior população negra no mundo, atrás apenas da Nigéria. Mais da metade da população é negra (53%), segundo dados da pesquisa de 2014 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). E essa parcela movimenta R$ 1,5 trilhão por ano no País, de acordo com a pesquisa “A Voz e a Vez - Diversidade no Mercado de Consumo e Empreendedorismo”, realizada pelo Instituto Locomotiva em parceria com o Instituto Feira Preta e com o Itaú Unibanco. Essa população quer se ver representada como protagonista dos produtos e serviços que consome. Tanto que está disposta a pagar 20% a mais em produtos que valorizam elementos da cultura afro, segundo a pesquisa. Se essas pessoas formassem um país, ele estaria no G20 do consumo mundial.
Nestes dois anos, quais as conquistas do Movimento Black Money?
Nós impactamos cerca de 100 mil pessoas com o conteúdo do portal, e-books, cursos online, palestras e eventos, em que parte dos ingressos é destinada ao público negro. Nossa proposta é levar a questão racial, tanto nossas falas quanto nossas ações, para muitos espaços. Outra grande conquista é a distribuição de bolsas de estudo, com o auxílio de nossos parceiros. O objetivo é expandir ainda mais nossas atividades. Para o segundo semestre, realizaremos cursos presenciais em cidades brasileiras, além de palestras no exterior. Também vamos ampliar os parceiros educacionais para aumentar o número de cursos e concessões de bolsas de estudo.
Quais as áreas de atuação do Movimento Black Money?
O Afreektech é nosso braço educacional que busca desenvolver o mindset inovador de empreendedores e jovens negros para torná-los competitivos no mercado. A proposta é democratizar a educação por meio de conteúdos e cursos de curta duração nas áreas de marketing, gestão e tecnologia. Mais do que estimular a criação de um negócio próprio, buscamos a profissionalização, levando em conta fatores como público consumidor e capital de giro. A ideia é estimular a mentalidade empreendedora para que o próximo unicórnio seja de donos negros. Já o StartBlackUp é o braço de networking, que promove a circulação do capital social, intelectual e econômico da população negra, por meio de encontros entre empreendedores e profissionais com investidores para gerar novos negócios. É preciso ter a nossa própria rede de valor, que passa pela sociabilidade e troca de informações e conteúdo.
E quais as próximas ações do Movimento Black Money?
Temos o projeto D’Black Bank, cujo objetivo é gerar acesso aos serviços financeiros com melhor tributação para clientes negros - pessoas física e jurídica. A proposta é incluir um terço da população brasileira que não é bancarizada e, portanto, não tem acesso a formas de pagamento com o uso de cartões de débito e crédito. Destes, 60% são negros e movimentam R$ 665 bilhões fora do sistema bancário, segundo pesquisa do Instituto Data Popular. Além disso, metade dos empreendedores no segmento das micro e pequenas empresas, com faturamento de até R$ 3,6 milhões por ano, são negros, de acordo com o Sebrae. Queremos oferecer educação financeira aos clientes, desmitificando a gestão das finanças pessoais e ressaltando a importância da prática econômica, tanto a doméstica quanto para investimentos. O maior desafio é fechar parcerias sem perder o propósito de agregar valor dentro da comunidade negra, impactando outros negócios. A ideia é fazer a roda girar sozinha: a lucratividade do D’Black Bank seria reinvestida nos projetos educacionais do Afreektech.
Como foi ter sido reconhecida como uma das 20 mulheres mais poderosas do Brasil pela Forbes?
Eu costumo dizer que carrego o navio negreiro em todo lugar que vou. A minha fala e a minha imagem não correspondem apenas à história da Nina, mas a história de um cordão umbilical que une Brasil e África em um mar sangrento. E isso não pode ser esquecido. Se hoje eu tenho a possibilidade de promover transformações, é por conta de toda a herança de luta que trago comigo. Não é uma herança de bens materiais, mas uma herança histórica, composta por ancestralidade e persistência. Por isso esta visibilidade deve ser utilizada para fins de coletividade através da organização em redes de fortalecimento para a verdadeira revolução que a Transformação Digital potencializa.
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